quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Fruta que é bom só se encontra na embalagem

                   Levantamento do Idec, com 18 produtos mostra que oito não têm polpa na composição

 Tem foto de fruta na embalagem, cor de fruta, sabor de fruta, mas não tem fruta. Essa foi a constatação do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) em relação a oito dos 18 produtos alimentícios industrializados avaliados em sua última pesquisa. A análise levou em consideração se os apelos relacionados a frutas nos rótulos estão condizentes com o conteúdo. E revelou ainda que a situação entre os dez produtos, que de fato têm frutas na sua composição, não é muito melhor do que a dos demais: metade não informa o percentual de polpa e dos cinco que o declararam a variação fica entre 1% e 10% dos ingredientes.

— É difícil para o consumidor leigo entender que o produto tem sabor de morango, mas não tem morango. E ao usar com grande destaque imagens de fruta na embalagem as empresas estão induzindo o consumidor a achar que está comprando um produto mais natural e saudável, o que nem sempre é verdade. Muitos têm excesso de açúcar e aditivos químicos justamente para imitar o sabor da fruta — destaca Sílvia Vignola, consultora técnica do Idec.

Para o levantamento, o Idec analisou embalagens de três fabricantes, em cada uma das seis categorias de produtos. No grupo dos iogurtes, foram avaliados Batavo Kissy morango, Lego Light Lective e Danoninho. No de refrescos em pó, Tang, La Frutta e Camp. Entre os isotônicos, Gatorade, Taeq e Marathon. Na classificação néctar de fruta, a pesquisa incluiu Top Fruit, Maguary e Del Valle-Kapo. Na categoria gelatina, Frutop, Dr. Oetker e Royal. E na de sorvetes, o sabor napolitano da Sorveteria Kidelícia de Sabor, da Nestlé, além do Kibon Balance.

Para Antônio Augusto Fonseca Garcia, nutricionista e coordenador da unidade técnica do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), o que a indústria faz ao usar e a abusar da imagem das frutas como chamariz em suas embalagens é propaganda enganosa:

— Há um apelo por uma alimentação mais saudável hoje em dia e as pessoas ao verem as imagens do rótulo são levadas a subliminarmente acreditar que estão comendo fruta. No entanto, os percentuais de polpa costumam ser insignificantes, a quantidade de açúcar muitas vezes é maior do que a dos refrigerantes. No fim do dia, quem consome muitos produtos industrializados pode, inclusive acabar ultrapassando o percentual máximo de aditivos químicos recomendados pela FAO — diz o nutricionista.

Luciana Pellegrino, presidente da Associação Brasileira de Embalagem (Abre), admite que o uso de fruta na embalagem confere uma conotação mais saudável ao produto, mas pondera que o recurso também é usado para facilitar a identificação do sabor do alimento. Ela destaca que a indústria segue as normas legais e que o segmento não pode criar suas próprias regras. Eventuais mudanças, diz Luciana, têm que ser discutidas com o poder público e o consumidor.

O Idec e o Conselho Federal de Nutricionista defendem, no entanto, mudanças imediatas independentemente da alteração das normas vigentes. Eles propõem informação mais clara ao consumidor, o que inclui além da divulgação do percentual de fruta dos produtos, a proibição do uso desproporcional ao conteúdo das imagens de frutas nas embalagens.

— Existe uma lacuna na legislação, já que ela não prevê a divulgação do percentual de fruta na composição. Mas as empresas podem e devem ir além da regulação, para benefício do consumidor. Além disso, já há leis, como o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que obrigam a informação clara e ostensiva ao consumidor. É preciso melhorar as regras, mas é fundamental aumentar a fiscalização, o que já seria suficiente para implementar mudanças.

Em enquete realizada pelo Idec, com internautas, aponta que 62% consideram difícil saber se há presença de frutas no alimento e que gostariam que houvesse uma regulamentação que obrigasse às empresas a informar o percentual na composição de seus produtos. Outros 25% defendem a mudança na regra para evitar propaganda enganosa.

A coordenadora técnica do Idec, que há 30 anos se dedica ao segmento, afirma que até mesmo para ela, algumas vezes, é difícil retirar o máximo de informação dos rótulos. Sílvia explica, no entanto, que há alguns macetes que podem ajudar a “leitura” das embalagens:

— Na listagem de ingredientes, por exemplo, os produtos aparecem em ordem decrescente. Ou seja, o primeiro da lista é sempre aquele que está em maior quantidade na composição. Outra informação que a maioria dos consumidores desconhecem é a diferença da definição entre suco, néctar e refresco. O primeiro é 100% fruta, o chamado néctar concentra de 30% a 40% de concentração, já os refrescos de 20% a 30% — explica Sílvia.

As empresas foram procuradas pela reportagem e a Unilever, a Danone e a BRF Foods informaram que seus produtos atendem todas as normas vigentes no país. A KraftFoods, a Ebba e a Vigor disseram que as informações que constam da pesquisa foram fornecidas pelas empresas ao Idec. O Grupo Pão de Açucar informou que embora os produtos Taeq atendam às determinações da Anvisa quanto à rotulagem, vai analisar os pontos abordados pelo Idec quanto a uma possível reformulação dos rótulos.

Fonte:  http://oglobo.globo.com/economia/fruta-que-bom-so-se-encontra-na-embalagem-3756478

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